Fala na Paulista sobre minuta de decreto implica ainda mais Bolsonaro em inquérito do golpe, dizem fontes


Fala na Paulista sobre minuta de decreto implica ainda mais Bolsonaro em inquérito do golpe, dizem fontes

O discurso do ex-presidente Jair Bolsonaro no ato de domingo com apoiadores na Avenida Paulista, em que fez referência a uma minuta de decreto de Estado de Defesa, implica ainda mais o ex-presidente na investigação a que responde perante o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre uma suposta tentativa de golpe de Estado, afirmaram nesta segunda-feira à Reuters duas importantes fontes da Polícia Federal.

Segundo as fontes, as declarações de Bolsonaro reforçam as suspeitas dos investigadores de que havia discussões e uma preparação, inclusive com a formatação de textos legais, para se impedir a assunção do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva após as eleições de 2022.

Em fala a milhares de apoiadores que lotaram a Paulista, o ex-presidente rejeitou a existência de uma suposta trama golpista com uso de tanques, mas chegou a discorrer sobre a legalidade de uma minuta de um decreto de Estado de Defesa.

“O que é golpe? É tanque na rua, é arma, é conspiração, é trazer classes empresariais para seu lado, nada disso foi feito no Brasil. Nada disso eu fiz, e continuam me acusando por golpe. Agora, o golpe é porque tem uma minuta de um decreto de Estado de Defesa. Golpe usando a Constituição? Tenham santa paciência. Golpe usando a Constituição. Deixo claro que Estado de Sítio começa com o presidente da República convocando os Conselhos da República e da Defesa. Isso foi feito? Não”, afirmou.

“Apesar de não ser golpe o Estado de Sítio, não foi convocado ninguém dos Conselhos da República e da Defesa para se tramar ou para se botar no papel a proposta do decreto do Estado de Sítio”, acrescentou, usando uma argumentação legalista.

Para uma das fontes da PF, que está envolvida nas investigações sobre golpe de Estado, o argumento do próprio Bolsonaro não faz sentido porque uma das minutas em discussão — que foi apreendida pela corporação em uma das operações deflagradas no início do mês — previa, por exemplo, a prisão do presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Essa fonte destacou que, pela legislação, o fato de haver minutas e a discussão delas por si só já configura o crime. Ela explicou que o delito, para ser tipificado, basta que ocorra a conduta de atentar contra o Estado Democrático de Direito.

A fonte disse ainda que o fato de Bolsonaro, na época presidente, ter convocado comandantes das Forças Armadas para discutir o impedimento da posse de Lula, com base em argumentos sabidamente falsos como o de fraude das urnas eletrônicas, também já configura o crime. “Usar tanques nas ruas e executar as prisões seriam condutas que apenas exauririam o crime”, ressaltou.

Procurada, a defesa de Bolsonaro não respondeu de imediato a um pedido de comentário.

As declarações do ex-presidente na Paulista ocorreram três dias após Bolsonaro ter permanecido em silêncio em depoimento à PF sobre a suspeita de tentativa de golpe de Estado.

Bolsonaro, que está inelegível até 2030 por condenação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) devido a irregularidades na campanha de 2022, ainda é alvo de uma série de outras investigações, como a de fraude em cartões de vacinação, recebimento irregular de joias sauditas e de envolvimento em uma espécie de milícia digital para atacar adversários.

Uma segunda fonte da PF ressaltou que a presença de alguns nomes e as falas públicas vão contribuir para a instrução do inquérito sobre o suposto golpe de Estado, e confirmou que possivelmente as declarações do ex-presidente serão incluídas formalmente na apuração.

A primeira fonte da PF disse ainda que o fato de Bolsonaro não ter atacado no domingo os ministros do STF e a PF não atenua em nada sua situação em relação às investigações. A fonte relembrou que Bolsonaro, em outros momentos, já chegou a recuar e pedir até mesmo desculpas.

A PF trabalha para tentar concluir as investigações ainda neste semestre. Após a conclusão das apurações e se considerar que há elementos, caberá à Procuradoria-Geral da República decidir se denuncia criminalmente o ex-presidente ao Supremo. Se a acusação for aceita pelo STF, ele passa a responder a processo que poderá ser condenado à prisão.

Fonte: Reuters

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